Davi Nogueira Lopes*

Pela manhã eu estava numa ótica no centro da cidade e, enquanto negociava novas lentes, ouvi um homem que estava conversando com um amigo dizer a seguinte frase: “hoje não é um dia romântico, mas um dia político”.

Aquilo me surpreendeu. Não porque fosse uma descoberta o conteúdo daquela frase, mas porque tive o contentamento de ouvi-la assim, tão despretensiosamente, no meio de um comércio, e de um homem.

Há menos de uma semana, o senhor Arthur do Val, conhecido como “Mamãe Falei”, deputado estadual de São Paulo, foi até a Ucrânia para promover ajuda humanitária e, enquanto encarava uma fila de mulheres refugiadas, verbalizou para seus amigos do WhatsApp a seguinte frase: “elas são fáceis porque são pobres”. No áudio que foi exposto ao público havia um punhado de outras frases tão abjetas quanto essa.

De todas as reações que pude ver contra a fala do senhor Arthur do Val, foi a de uma mulher, a comentarista Ana Paula Henkel, da Jovem Pan, que realmente me sensibilizou. Ana Paula estava ao vivo quando ouviu pela primeira vez o conteúdo do áudio gravado pelo deputado paulista, e a reação que aquilo provocou foi surpreendente. Progressivamente, ela foi sendo psicológica e fisicamente afetada, violentada mesmo. Ao final, a comentarista simplesmente não conseguiu comentar, disse que não tinha palavras e até pediu para a produção tirá-la do ar. Mas era nítido também que não havia fraqueza naquela mulher. Havia dor, indignação, raiva e muita força.

Em 1975 a ONU instituiu o 8 de março como data oficial para se reconhecer as duras lutas pelas quais passaram e passam as mulheres para ver garantidos seus direitos sociais, políticos e econômicos. Passados quase meio século, é duro ver que a sociedade não atingiu um grau de aculturamento que torne impensável que homens possam encarar mulheres como objeto sexual, ainda mais naquele contexto.

A nós, homens, cabe inicialmente o dever moral de reconhecer que somos, sim, contaminados por uma herança maldita de nossos pais e avós, que é o machismo.

É preciso assumir, por exemplo, que a prostituição feminina, muitas vezes de crianças, tem como causa a objetificação da mulher.  A violência contra as mulheres também é fruto do machismo, e os números são alarmantes no Brasil.

Portanto, que o dia 8 de março também seja nós, os homens, um dia político. Que assumamos nossa responsabilidade como pessoas transformadoras da sociedade e, ao lado das mulheres, possamos construir um lugar melhor para nossos filhos e filhas.

Às mulheres, que recebam nossas homenagens pelas conquistas históricas de seus direitos, e nosso incondicional apoio nas lutas atuais e vindouras.

 

* Davi Nogueira Lopes

Mestre em Direito pela UFMS (área de concentração Direitos Humanos)

Advogado da ADEP/MS.

 

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